Moacyr Castellani, após participar do Evento What Now com Ken Wilber em Denver (Dez 2017 / Jan 2018), entrou em contato com Ken e solicitou se ele poderia compartilhar o texto original de sua apresentação. Gentilmente Ken cedeu o arquivo e também autorizou compartilhá-lo com as pessoas que desejarem recebê-lo.
Em seguida, Ari Raynsford gentilmente traduziu o texto para português e Darcy Brega realizou a revisão.
Segue abaixo o texto completo.
OS SENTIMENTOS DA ILUMINAÇÃO - Ken Wilber (Palestra proferida no Simpósio WHAT NOW em Broomfield, CO, em dezembro de 2017)
Tradução de Ari Raynsford / Revisão de Darcy Brega
"Venho apresentando uma Abordagem Integral à realidade desde o meu primeiro livro,
O Espectro da Consciência, que foi escrito quando eu tinha 23 anos – isso foi quase meio
século atrás. E ao longo dos anos, tem sido interessante ver o que várias pessoas – as que
adotaram a Estrutura Integral – fizeram com os aspectos espirituais da mesma; o que fizeram
com a dimensão Waking Up [Despertar]... Porque cerca de metade das pessoas que usam
a Estrutura Integral parece incluir a dimensão espiritual e cerca de metade, não. Eu nunca
sustentei que alguém tivesse de abraçar a espiritualidade para poder usar uma Abordagem
Integral – você é totalmente livre para incluir ou não a espiritualidade, a seu bel-prazer. Na
cultura atual, muitas pessoas inteligentes esquivam-se completamente de tópicos religiosos,
devido em grande parte ao modo verdadeiramente infantil como a maioria da espiritualidade
institucionalizada é praticada – em um nível baixo de Growing Up [Crescimento], mágico ou
mítico, sem nenhum Waking Up. Agora, na minha vida, eu procuro incluir a dimensão
espiritual de forma madura e integral, proveniente de um nível elevado de Growing Up, e
incluir as melhores tradições de Waking Up. Acredito que uma espiritualidade integralmente
interpretada e integralmente fundamentada é uma dimensão profundamente importante da
nossa existência. Afinal, as Grandes Tradições da Sabedoria mantêm vigorosamente essa
dimensão espiritual como o Fundamento de Todos os Seres, representando uma genuína
Verdade suprema, e não simplesmente uma verdade relativa oferecida, por exemplo, pela
ciência (embora as verdades relativas da ciência certamente precisem ser incluídas – esse
é um ponto central da Abordagem Integral).
Mas por que, especialmente no mundo de hoje, tem sido uma boa ideia incluir um
autêntico componente de Waking-Up na minha vida? Por que precisamos de algo como uma
prática de Waking-Up em primeiro lugar? Existe realmente algo chamado Iluminação,
Despertar, Satori, Moksha, a Grande Libertação?
Bem, sim, existe. As Grandes Tradições de Sabedoria sustentam unanimemente o
que é chamado de "Doutrina das Duas Verdades". A saber, existe a verdade relativa e existe
a Verdade absoluta (ou Verdade última). A verdade relativa inclui coisas como: "a terra é um
dos nove planetas que circundam o sol" ou "o núcleo de um átomo contém prótons e
nêutrons". As Tradições sustentam que tais verdades relativas são importantes e todas
precisam ser incluídas em qualquer compreensão abrangente do nosso mundo. Mas elas
também afirmam que existe a Verdade última, e que essa Verdade, em especial, precisa ser
incluída. Enquanto a verdade relativa diz coisas como "a terra é o terceiro planeta a partir do
sol" ou "a água é composta de um átomo de oxigênio e dois átomos de hidrogênio", a
Verdade última afirma que hidrogênio e oxigênio, e a terra e os planetas são todos feitos de
Espírito – são todos manifestações da grande Essência do Ser. E, além disso, essa Verdade
última pode ser diretamente conhecida. Um indivíduo pode despertar para essa Essência do
Ser, envolvendo-se em várias práticas e exercícios que, basicamente, alteram o estado de
consciência de uma pessoa – de um estado relativo de consciência, ligado ao ego finito e,
portanto, limitado, fragmentado e constantemente atormentado, para um estado final de
consciência de unidade, uno com a Verdade absoluta e livre do ego, do sofrimento e do
tormento. A verdade relativa ainda é real e continua existindo, mas tudo existe como uma
manifestação da suprema Essência do Ser. E você pode descobrir e experienciar
diretamente essa grande Essência do Ser – uma experiência ou realização conhecida por
Iluminação, Despertar, Metamorfose, Satori, Moksha, Fana – em resumo, Waking Up.
As evidências, por todo o mundo e ao longo da história, dessa experiência de
Iluminação ou Satori são simplesmente impressionantes. Ela ocorre espontaneamente
(pesquisas recentes reportam que cerca de 60% da população já tiveram uma forte
experiência de sentir-se uno com todo o universo, proporcionando-lhes uma paz de espírito
profunda, amorosa e beatífica). Mas para que a experiência se torne estável e duradoura –
para se passar de uma experiência de pico temporária para uma experiência de platô mais
permanente – em geral, a pessoa precisa adotar uma prática espiritual contínua de algum
tipo.
E o problema com essa ideia é que a maioria das tradições espirituais, além de
elementos profundos da Verdade última, também incorporaram um grande número de
elementos supersticiosos, infantis, muitas vezes totalmente ingênuos (desde a abertura do
Mar Vermelho por Moisés, a Lao Tsé ter nascido com 900 anos de idade, a transformação
da esposa de Ló em uma estátua de sal, a arca de Noé e assim por diante, indefinidamente).
Esse fato está por trás da frase frequentemente ouvida: "eu sou espiritualista, mas não
religioso", onde "religioso" significa as típicas formas institucionalizadas tradicionais de
espiritualidade com suas incríveis tolices (a propósito, "espiritualista, mas não religioso" é
uma frase que cerca de 70% dos Millennials dizem descrevê-los). Portanto, à medida que
buscamos no mundo das Grandes Tradições práticas e exercícios que nos ajudarão
efetivamente a Despertar, o que precisamos fazer é estar atentos a modos de espiritualidade
infantis, supersticiosos, mágicos ou míticos que infestaram praticamente todas as primeiras
formas de religião, e tomar cuidado para aceitar e utilizar apenas os modos de espiritualidade
que apresentam tanto a verdade relativa quanto a Verdade última. Isto exigirá uma boa
quantidade de ajustes das Grandes Religiões; eu sugeri algumas maneiras de fazê-los no
meu recente livro The Religion of Tomorrow.
Alcançar este tipo de espiritualidade madura e autêntica, que inclui tanto um Growing
Up bem desenvolvido quanto um Waking Up verdadeiramente eficaz, oferece-nos especial
consolo e libertação do estado de espírito pós-moderno padrão dos nossos tempos, que é a
implacável depressão devida à triste, até mesmo alarmante, situação do mundo
contemporâneo. Desvelar a grande Essência do Ser – sua própria Face Original e Eu Real
– a Grande Perfeição que é o seu Ser mais profundo e verdadeiro – este é o único antídoto
realmente eficiente para o tormento epidêmico que agora inunda o planeta para onde quer
que se olhe. Descobrir que você, no mais profundo núcleo do seu Ser, é de fato a Luz do
Mundo extinguirá qualquer angústia, qualquer depressão torturante e tristeza aflitiva que
possam, de alguma forma, assolar sua consciência. Inicialmente, pensei em fazer hoje uma
apresentação baseada em outro livro recente que acabei de escrever, intitulado Trump and
a Post-truth World [Trump e um Mundo Pós-verdade], que focaliza o dilema pós-moderno
que está subvertendo o globo. Boa parte deste Simpósio está focada neste tema, e com
razão. Depois pensei em simplesmente abordar, não o dilema pós-moderno em si, mas o
único importante e verdadeiro antídoto para essa atmosfera absolutamente deprimente,
sombria e debilitante – ou seja, uma genuína Iluminação ou Despertar. Em outras palavras,
trataremos da Verdade última. A verdade relativa ainda é extremamente importante –
praticamente todo o trabalho efetivo que desenvolvemos no mundo atual é realizado através
de vários caminhos da verdade relativa. Growing Up [Crescer], Showing Up [Estar Presente],
Opening Up [Abrir-se] e Cleaning Up [Purificar-se] – praticamente todos eles lidam com
aspectos incrivelmente importantes da verdade relativa, aspectos deste mundo finito,
manifesto e convencional, e de como trazê-lo para formas mais inclusivas, abrangentes,
saudáveis e integrais. Mas subjacente a tudo isso está o Waking Up [Despertar] para a
Verdade última – a Essência, a Fonte, a Condição e a Natureza de todas as verdades
relativas. Desejamos uma real integração da verdade relativa com a Verdade última
(diagrama AQAL – verdade relativa; papel sobre o qual é desenhado – Verdade última).
Assim, enquanto muitas das apresentações deste Simpósio concentram-se em importantes
verdades relativas que abordam vários desastres pós-modernos, esta tarde estaremos nos
concentrando na Verdade última, e a importância de incluí-la em qualquer verdadeira
Abordagem Integral do mundo.
E o que eu, particularmente, quero fazer aqui é salientar os sentimentos reais que
acompanham este estado de Waking Up [Despertar]. Na maioria das vezes, são
apresentados os aspectos cognitivos da Consciência Desperta, tais como: a Iluminação
apresenta uma consciência que é não dual e totalmente unificada; ou envolve desvelar uma
Consciência totalmente abrangente verdadeiramente sem preferências – ou lhe são dados
alguns de seus aspectos ontológicos, tais como: o mundo é, na verdade, uma Grande Teia
da Vida, com cada coisa interconectada a outras; ou é uma grande rede entrelaçada de
existência unificada e Unidade divina abrangendo todo o universo; ou é uma Grande Cadeia
do Ser, seguindo da matéria para o corpo para a mente para a alma para o espírito, e você
pode perceber sua unidade com tudo isso. E há um pouco verdade em cada uma dessas
afirmações.
Mas o que não é tão frequentemente mencionado ou utilizado é o fato de que todos
os estados de consciência Iluminados ou Despertos também têm emoções profundas
associadas a eles. A Iluminação vem com sentimento. Waking Up vem com emoção. Você
não tem apenas uma Consciência da Iluminação, você consegue senti-la. E esses
sentimentos e emoções podem ser usados – da mesma forma que os aspectos cognitivos e
ontológicos – como direções de uma bússola para ajudá-lo a buscar e descobrir seu próprio
Eu Iluminado. Não se torne simplesmente cada vez mais consciente de todos os seus
pensamentos e ações; não procure apenas por uma Consciência não dual sem preferências;
não busque apenas um mundo completamente unificado e totalmente interligado. Faça tudo
isso por todos os meios; mas também procure sentir tudo isso; procure pelo real Sentimento
de Iluminação. Não apenas ore pela sua Iluminação, não apenas medite sobre seu caminho
para a Iluminação – sinta seu caminho para a Iluminação.
E que Sentimentos são esses? E como posso saber que tenho os Sentimentos
corretos? Bem, esta parte é simples – e é aí que o sexo entra em cena.
Apresentarei alguns dos estados superiores e mais elevados de consciência – e
algumas instruções pontuais para que cada um de vocês possa experienciar diretamente
esses estados superiores, especialmente aqueles estados que se diz estarem associados à
Iluminação e ao Waking Up. E, em seguida, exploraremos os Sentimentos profundos que
acompanham esses Estados, de forma que você terá um conjunto de pontos cardeais em
sua própria vida para poder usá-los para Waking Up.
E é isso que nos levará diretamente ao sexo. Mais especificamente, ao caminho
espiritual conhecido como Tantra, que usa a sexualidade convencional cotidiana como uma
senda direta para o Espírito, um caminho reto para a Iluminação. Mas vamos usar uma
abordagem particularmente Integral para essa questão, de modo que, mesmo que você
esteja familiarizado com o Tantra, esta versão lhe parecerá bastante nova.
Comecemos com algumas informações básicas necessárias. Nós já mencionamos a
verdade relativa e a Verdade última. A maioria das pessoas vive com um conhecimento
consciente de vários tipos de verdade relativa; em geral, elas estão completamente
inconscientes da Verdade última. As Grandes Tradições afirmam universalmente que esse
estado – o estado de conhecer apenas a verdade relativa e não a Verdade última – é, de
fato, um mundo decaído, um mundo de pecado original, um mundo intrinsecamente
alienado; um mundo que Buda dizia não passar de dukkha ou sofrimento implacável; é a
caverna de Platão, onde as pessoas estão presas, observando apenas sombras ao fundo,
completamente inconscientes da grande Luz da Realidade fora da caverna; este é um
mundo que tanto o Hinduísmo quanto o Budismo chamam de um mundo de ignorância, onde
estamos dormindo e completamente inconscientes do nosso Eu mais verdadeiro e da
Realidade mais profunda.
Em outras palavras, os típicos estados de consciência que a maioria das pessoas
vivencia estão mergulhados nessa ignorância. Portanto, praticamente todos os estados mais
comuns que as pessoas experimentam não são estados finais – eles não são eternos, não
são infinitos, não são inclusivos, não são Iluminados e não são Despertos. Mas ao modificar
a consciência de modo que ela não fique presa a esses estados menores e relativos e, em
vez disso, encontre estados definitivos ou absolutos – que, de fato, são considerados
eternos, infinitos e totalmente abrangentes – podemos descobrir, por nós mesmos, a
suprema Essência do Ser, o Sol radiante fora da caverna. E essa descoberta é chamada de
Iluminação, Despertar, Satori, a Grande Libertação.
Em geral, as diversas Tradições classificam os principais estados relativos que os
humanos têm disponíveis, bem como os vários estados superiores que eles também podem
perceber. Um esquema comum – que encontramos no Hinduísmo, no Budismo Tibetano e
em diversas Escolas Neoplatônicas ocidentais – apresenta cinco principais estados
consciência, três relativos e dois absolutos ou finais. Vamos dar especial atenção aos dois
estados finais, já que são aqueles diretamente ligados à Iluminação.
Mas apenas para registro, os três estados relativos são geralmente conhecidos como
estado denso, estado sutil e estado causal. Um exemplo do estado denso é a consciência
comum de vigília, com um ego isolado, consciente de um mundo meramente material, o
mundo que pode ser percebido pelos sentidos. Um exemplo de um estado sutil é o estado
de sonho, onde a extraordinária criatividade da consciência cria mundos inteiros a partir do
nada. E um exemplo do estado causal é o sono profundo sem sonhos, que a maioria das
pessoas experiencia como um tipo de imenso vazio, mas as Tradições afirmam ser, na
verdade, uma experiência direta do infinito informe ou essência espiritual (e elas sustentam
que o estado causal pode ser vivenciado dessa forma por meditadores que pratiquem há
muito tempo, e que há uma grande quantidade de evidências experimentais de que isto é
verdade).
Mas esses são todos estados relativos, o que significa que são separados uns dos
outros; todos existem no tempo, são temporais – isto é, eles vêm, ficam um pouco e vão
embora. Todos têm qualidades ou características, e elas diferem umas das outras. E
nenhum desses estados é verdadeiramente inclusivo ou abrangente (cada estado relativo
exclui os outros – você não pode, por exemplo, estar no estado de vigília e no estado de
sono profundo sem sonhos ao mesmo tempo); assim, nenhum deles pode ser a Essência
de Todos os Seres; nenhum deles é absoluto ou definitivo. Diz-se que os estados derradeiros
são completamente unos com o Espírito; são, portanto, eternos, infinitos, totalmente
inclusivos. E como a maioria das pessoas não vivenciou diretamente esses estados finais,
mas apenas tem acesso a estados relativos, essa maioria realmente é não Iluminada, não
Desperta, não Autorrealizada; ela vagueia, entorpecida e míope, por um mundo decaído,
dormente, ignorante, mergulhado em dukkha e, muitas vezes, em trevas suicidas.
Mas há um ponto ainda mais profundo nas Grandes Tradições. A maioria das pessoas
parece ser completamente ignorante ou não Iluminada; elas parecem estar totalmente
inconscientes da infinita e eterna Essência do Ser que é seu próprio Eu mais profundo e
Condição genuína. E é verdade; a maioria das pessoas é ignorante; mas essa ignorância,
afirmam as Tradições, é uma ilusão, não é de fato real. Ao contrário, o estado de Iluminação
não é algo difícil de alcançar; na verdade, é impossível evitá-lo. Realmente, aqui e agora,
você está totalmente Iluminado, totalmente Desperto, totalmente Realizado. Isto não é algo
que você possa criar, alcançar ou atingir; em vez disso, é sua Consciência, exatamente
como é agora, totalmente Iluminada. Como afirma o Zen: "a mente cotidiana, apenas, é o
Tao". E é por isso que as Tradições mantêm, repetidamente, que a Iluminação não é algo
que você possa alcançar. Jesus Cristo ressalta que você já está salvo; você não precisa ser
perdoado, você já está, pela graça, completamente salvo. Os principais textos budistas, os
Sutras Prajnaparamita, repetem sempre: "se você conseguisse perceber que a Iluminação
é inatingível, você estaria Iluminado". "Inatingível" é a palavra que eles usam; a Iluminação
é inatingível porque já está totalmente presente. Você não pode atingir a Iluminação tanto
quanto não pode alcançar seus pulmões ou adquirir seus pés.
Portanto, como isso funciona exatamente? Observe que estamos usando a palavra
"eternidade" e aplicando-a à Verdade última e à Iluminação. Isto é, a Verdade última e a
Iluminação não são temporais, são eternas. Ora, a maioria das pessoas pensa que
eternidade significa realmente muito tempo mesmo; tempo fluindo para sempre, sem fim.
Mas isto não é eternidade, é apenas o tempo estendido indefinidamente. Isto não é a Luz
fora da caverna, isto é apenas um grande amontoado de sombras, todas empilhadas.
Eternidade não significa tempo para sempre; significa um ponto sem tempo. Significa um
momento intemporal, um Agora intemporal, onde o tempo some completamente e há apenas
um momento Agora sem fim, que nunca entra no fluxo do tempo, mas está totalmente
presente em cada ponto do tempo.
Expliquemos passo a passo, de forma bem simples: eternidade significa intemporal;
intemporal não significa tempo eterno, mas um ponto sem tempo; sendo sem tempo, a
eternidade não rivaliza com o tempo e, assim, ela (já que é completamente intemporal) se
encaixa completamente em cada momento de tempo; e isso significa que a eternidade está
sempre presente, a eternidade está completa e totalmente presente agora, toda ela – no
chamado Agora intemporal ou Presente puro. O grande filósofo Wittgenstein disse isto de
maneira simples e clara: "se consideramos o significado de eternidade como, não a duração
temporal eterna, mas como um momento sem tempo, então a vida eterna pertence àqueles
que vivem no presente".
Tudo bem? Você não pode alcançar a Iluminação porque ela é definitivamente eterna,
o que significa intemporal, o que significa sempre presente, o que significa totalmente
presente justamente agora. E isso não é algo difícil de ver, é impossível de não ver. Eis
exatamente por quê:
Já que "a vida eterna pertence àqueles que vivem no presente", temos a famosa
injunção de que para ser Iluminado, você apenas tem de "Estar Aqui Agora" – esta injunção
significa viver plena e completamente no Agora intemporal. E é dito que se você conseguisse
viver plenamente neste Agora intemporal – se conseguisse "Estar Aqui Agora"
completamente – então você seria Iluminado. Todo mundo concorda com isso. Quando lhe
ensinam a meditação mindfulness [atenção plena], por exemplo, você aprende a prestar
atenção apenas no presente passageiro – você ignora o passado e ignora o futuro, e só
presta atenção ao momento presente. E se você estivesse vivendo continuamente apenas
este presente momento Agora, você estaria Iluminado.
Mas o ponto mais profundo das Tradições é que, como dissemos, você já está
Iluminado – e, portanto, isso significa que você já está vivendo plenamente no Agora
intemporal e não tem de praticar viver no Agora? Sim, é exatamente isso. O ponto central é
que o tempo em si é uma ilusão, e você está sempre consciente apenas do Agora intemporal
– e isso já está acontecendo neste momento. A maioria de nós acredita que estamos
existindo em um mundo de tempo, e esse tempo se desdobra em uma sequência do passado
para o presente para o futuro. Mas essa é exatamente a ilusão; você nunca está consciente
de um fluxo de tempo ou de qualquer coisa que exista no passado ou no futuro – o que você
sempre está consciente é de um Agora intemporal (e é exatamente por isso que você já está
Iluminado).
Se você não acredita, vá em frente e pense em qualquer coisa do seu passado. Tenha
uma boa lembrança dessa coisa, veja-a claramente. Mas note que tudo o que você está
realmente vendo é uma memória, e essa memória existe apenas neste momento Agora. E
quando esse evento realmente ocorreu, ocorreu no momento Agora. Em qualquer caso, há
apenas um momento Agora intemporal. Da mesma forma, pense sobre qualquer coisa do
futuro. Essa, também, é apenas um pensamento, e esse pensamento existe apenas neste
Agora intemporal. E se ele se tornar uma realidade em algum momento, esse momento
também será um momento Agora.
Em outras palavras, tudo do que você está realmente consciente é de um momento
Agora intemporal, de uma eternidade sempre presente. Você não precisa se concentrar
apenas no presente passageiro e tentar não pensar sobre o passado ou o futuro – pense
em qualquer coisa que você queira, passado, presente ou futuro, e todos esses
pensamentos existirão totalmente apenas neste eterno e intemporal Agora. Portanto,
novamente: não é difícil atingir o Agora intemporal; é impossível evitá-lo. E é por isso que
sua consciência presente, exatamente como está agora, é uma Consciência Iluminada – "a
mente cotidiana, apenas isto, é o Tao" – em outras palavras, "sua mente cotidiana, sempre
presente, assim como é, está Iluminada". E é por isso que você não pode alcançar a
Iluminação. Sua mente cotidiana, assim como está surgindo neste momento, já está sempre
vivenciando um eterno Agora e, portanto, é totalmente eterna, inteiramente Iluminada. Você
pode não perceber isto completamente, mas esta é a única realidade que está realmente
ocorrendo – SEMPRE.
Isto é bem interessante, mas eis o verdadeiro truque: todos os estados finais são em
si mesmos eternos, quase por definição (qualquer coisa final deve ser eterna, certo?) – mas
nós acabamos de ver que eterno não significa tempo para sempre, e sim intemporal – e
intemporal significa totalmente presente a cada momento – e isso significa que esses
estados finais estão sempre presentes – todos eles estão completa e inteiramente presentes
em sua Consciência do jeito que ela está surgindo aqui e agora.
É por isso que as abordagens mais elevadas dos Grandes Caminhos da Libertação
não lidam com meditação, contemplação ou oração – essas são excelentes práticas, mas
tudo o que elas fazem é tentar trazer certos estados à existência, ou ajudá-lo a alcançar
vários estados mais elevados – mas os estados mais elevados, os estados últimos, não
podem ser alcançados, atingidos ou criados – porque eles estão sempre já total e
integralmente presentes exatamente agora.
E se você realmente se propõe a tentar encontrar um Estado espiritual supremo, você
está simplesmente assumindo que o Estado supremo não está presente agora e, assim,
você continuamente nega sua existência tentando encontrá-lo – a busca em si assume
continuamente que ela não está presente Agora – e, portanto, enquanto você o estiver
procurando, NUNCA o encontrará. NUNCA.
Desse modo as práticas mais elevadas das Grandes Tradições não são a meditação,
a contemplação ou a oração; elas são chamadas de "instruções pontuais". Uma vez que os
estágios derradeiros estão completa e integralmente presentes em você agora, o professor
simplesmente indicará esses estados, talvez os descrevendo singelamente até que você
consiga realmente percebê-los. Uma instrução pontual é exatamente o que acabei de fazer
com o Agora intemporal. Já que o Agora intemporal está totalmente presente em cada
pessoa, tudo o que eu tive de fazer foi pontuá-lo, e você o percebeu. Você também percebeu
que este Agora intemporal é tudo de que você está consciente, dando-se conta ou não. Você
não pode atingi-lo ou alcançá-lo; você só pode constatá-lo, lembrar-se dele, confirmá-lo. E
é isto que as instruções pontuais ajudam você a fazer – reconhecer algo que já está
presente.
Trabalharemos, basicamente, com os dois mais elevados ou derradeiros estados de
consciência; e esses estados já estão total e completamente presentes em você agora. Você
está 100% consciente deles, neste momento. Você pode não perceber isto imediatamente
– assim como provavelmente não percebeu que só estava consciente de um Agora
intemporal até que eu o pontuei. E porque o Agora intemporal está sempre já presente, você
pode vê-lo imediatamente. E é o que vamos fazer com esses dois mais elevados ou
derradeiros estados. Ambos já são totalmente existentes – eles já estão integralmente
presentes precisamente porque são sempre presentes, isto é, intemporais e eternos. Assim,
vamos simplesmente pontuá-los.
Em suma, assim como você provavelmente não estava ciente do Agora intemporal
até que eu o pontuasse, provavelmente não está ciente desses dois estados superiores e
definitivos – não até que eles sejam apresentados. E é aí normalmente que surge a principal
dificuldade com as práticas espirituais. Esses dois estados supremos são de fato eternos, o
que significa intemporais, sempre presentes, total e integralmente manifestos neste
momento. Mas mesmo que isso seja verdade, a maioria das pessoas não os percebe. Em
parte, porque esses estados são tão óbvios a ponto de serem muito facilmente ignorados.
Os tibetanos têm um ditado: "Muito fácil de acreditar, perto demais para ver". Sem dúvida.
Como dito por Meister Eckhart: "Deus está mais perto de mim do que eu de mim mesmo".
Absolutamente certo; e é por isso que é tão difícil perceber – é fácil demais, o que, às vezes,
dificulta muito.
É aqui que entra o Tantra. E agora, eu vou passar a dizer-lhe cada uma das coisas
que pontuarei esta tarde. Primeiramente, apresentarei os pontos importantes – e, em
seguida, passarei o resto do tempo indicando algumas práticas para ajudá-lo a ver o que, de
fato, já está acontecendo.
Você se recorda que muitas Tradições afirmam que temos cinco principais estados
de consciência? Três estados relativos (denso, sutil e causal); e dois estados finais. O
primeiro e menor dos estados derradeiros – que é o quarto estado geral – é conhecido por
"turiya", palavra em Sânscrito que significa literalmente "o quarto" – é o quarto estado além
dos três primeiros, daí a razão de seu nome bem prosaico.
Este quarto estado, turiya, como todos os estados derradeiros, está sempre presente.
É simplesmente a Consciência pura em si – não qualquer conteúdo da Consciência, apenas
a própria Consciência. Você está consciente do que está acontecendo agora? Bem, esse é
o estado de turiya, e você o perceberá desde que se concentre de fato nessa Consciência e
pare de focar meramente seu conteúdo – esta é uma instrução pontual específica que
exercitaremos daqui a pouco. Mas passamos todo o nosso tempo olhando para o conteúdo
da Consciência – esta cadeira ou aquele computador ou este carro ou aquela montanha e
assim por diante, indefinidamente – e nunca entramos em contato apenas com a
Consciência em si, que é turiya.
Este quarto estado é frequentemente chamado de Testemunha, porque é apenas uma
pura Consciência Testemunhante, que está consciente de cada coisa e evento que surge,
mas sem nenhum julgamento, condenação ou identificação. Por isso, também é chamado
de Mente Espelho, porque reflete uniforme e igualmente, sem reter, sem rejeitar – nada
gruda.
Encontrar essa Consciência – novamente, não algum conteúdo da Consciência,
apenas a Consciência em si – é descobrir a parte mais profunda que existe em você. Assim,
esse estado turiya também é conhecido como seu Eu Verdadeiro, seu Eu Real, Purusha,
Atman, o Novo Adão, consciência de Cristo, mente de Buda, Espaço infinito, puro Eu Sou.
Eis outro ponto importante: a característica básica desta genuína Consciência
Testemunhante é um senso de Liberdade radical, e uma Liberdade que você pode sentir
diretamente agora. A Testemunha olha para a experiência da seguinte forma: "Eu tenho
sensações, mas eu não sou essas sensações; eu tenho sentimentos, mas não sou esses
sentimentos; eu tenho pensamentos, mas eu não sou esses pensamentos – eu sou uma
Testemunha pura, clara e aberta de todos eles...; mas não me identifico com nenhum deles"
– e, desse modo, a Testemunha vivencia uma profunda Liberdade: não se identifica com
sentimentos, está consciente de sentimentos, por isso está livre deles – possui sentimentos,
não é possuída por sentimentos. E a Testemunha não se identifica com pensamentos; ela
está consciente de pensamentos, mas está livre deles – tem pensamentos, pensamentos
não a têm. Sempre que você está verdadeiramente Consciente de algo, você está Livre dele;
a Consciência total traz uma Liberdade total.
A Testemunha em você, exatamente agora, está Consciente de absolutamente tudo
o que está surgindo – é uma vasta Abertura ou Clareira em que todas as coisas e eventos
emergem, agora, momento a momento. Quando realmente descobrir a Testemunha – e nós
daremos instruções pontuais mais detalhadas daqui a pouco – você encontrará uma
Liberdade profunda do mundo inteiro, uma impressionante liberação de tudo que o prende.
Essa descoberta do seu Eu Verdadeiro é o começo da Iluminação; e é por isso que a
Iluminação é chamada de "a Grande Libertação".
Então, que Sentimento acompanha essa profunda Liberdade? Eis outro ponto
importante: de acordo com as Tradições, embora possam surgir vários sentimentos, o
Sentimento mais comum desta completa Liberdade é uma imensa Alegria, um profundo
Êxtase, uma Felicidade essencial, uma intensa Bem-aventurança – é o seu Coração com
um "big smile button". E qualquer um desses termos servirá – Alegria, Felicidade, Êxtase;
mas o mais comum é Bem-aventurança. A palavra em Sânscrito para "bem-aventurança" é
ananda. É por isso que se diz que a Realidade suprema é SatChitAnanda – ou Ser,
Consciência e Bem-aventurança. Se você realmente vivenciar a Grande Teia da Vida, sentirse-
á inundado de Felicidade extática, Bem-aventurança profunda, em cada célula do seu
ser. Praticamente todas as grandes escolas tântricas de todo o mundo sustentam que a
descoberta do seu Eu Verdadeiro e da Unicidade Divina – a Iluminação em si – é marcada
por "maha-sukha" ou Grande Bem-aventurança. Quando descobre seu Eu Verdadeiro, você
fica muito, muito Feliz, em cada ponto do seu corpo. Chamemos essa Bem-aventurança
suprema de "Grande Bem-aventurança", para indicar que é um estado final, eterno,
intemporal e sempre presente.
E uma vez que este é um estado final, significa que o sentimento de Grande Bemaventurança
é um sentimento sempre presente, é um sentimento que está totalmente
presente neste momento – mas, assim como o eterno Agora, não é algo que você reconheça
naturalmente. E é exatamente aqui onde entra o Tantra sexual, porque um dos sentimentos
de sexualidade mais comuns, o orgasmo, é um êxtase intenso ou de grande bemaventurança.
Ora, essa felicidade sexual, esse êxtase orgástico, é apenas um estado
relativo. Isto é, temporal, existe no fluxo do tempo; ele virá, ficará um pouco e depois passará.
Mas usando técnicas que abordaremos daqui a pouco, você pode usar esses sentimentos
temporários de êxtase sexual como uma forma de reconhecer, relembrar e aguçar o sempre
presente Sentimento de Grande Bem-aventurança. Ao experienciar o êxtase sexual finito,
você usará esses sentimentos finitos como um lembrete, uma indicação, para os
sentimentos mais profundos da sempre presente Grande Bem-aventurança – ou Alegria
radiante ou Felicidade profunda, o termo que melhor funcionar para você. Você transferirá
os sentimentos da bem-aventurança sexual temporária diretamente para a Testemunha
sempre presente e, como essa Testemunha Bem-aventurada, você, uniforme e igualmente,
estará consciente de tudo que surge momento a momento. O notável psicólogo Abraham
Maslow descreveu esse estado como sendo, não uma experiência de pico, que vem e vai,
mas uma experiência de platô, que é mais permanente. Ele diz: "Podemos aprender a ver
de uma forma unitiva quase a nosso bel-prazer. Assim, transformamo-nos em uma
testemunha com uma serena bem-aventurança cognitiva." Eis a Testemunha Bemaventurada.
Em suma, tudo o que você precisa saber sobre o quarto e derradeiro estado de
consciência é: a Grande Bem-aventurança é o Sentimento de infinita Liberdade da
Testemunha pura – Bem-aventurança é o Sentimento de Liberdade da Testemunha. E
você pode usar a sexualidade como uma indicação direta para esse eterno, intemporal e
sempre presente estado do seu próprio Ser mais profundo. Falaremos exatamente sobre
como fazer isso daqui a pouco.
Em seguida, olharemos para o quinto e mais elevado estado, conhecido como
"turiyatita", que significa "além de turiya" ou além do quarto estado. Ele está além da
Testemunha porque a sensação de que existe uma Testemunha, que se afasta e observa
imparcialmente tudo, dá lugar a uma Consciência unificada completamente não dual que é
radicalmente una com tudo. Você não testemunha a montanha, você é a montanha; você
não vê as nuvens, você é as nuvens; você não está nesta sala, esta sala está em você. Uma
sensação de Liberdade dá lugar a uma sensação de Plenitude – Plenitude total, radical. O
Mundo todo surge dentro de você – e você é Isto – um estado que os tibetanos chamam de
"Sabor Único". O universo inteiro é Sabor Único, e esse Sabor é Divino; e é isto que você
verdadeira e profundamente é – os Sufis chamam este estado de "a Identidade Suprema",
porque você é um com a Essência do Ser Total e, portanto, um com o universo inteiro – e
essa é a maior identidade que você pode ter – a Identidade Suprema. À medida que sua
Consciência se aprofunda além da Testemunha, ela se abre diretamente para a Plenitude
deste Sabor Único, e você está verdadeiramente em Casa. O universo inteiro está coberto
de chocolate e você acabou de engoli-lo.
Então, que Sentimento surge com essa Plenitude total? Amor. Óbvio, não? Como o
Evangelho de João diz simplesmente: "Deus é Amor". Mas – e isto é importante – esse não
é apenas amor relativo, que existe no tempo, e vai e vem, fica um pouco e se afasta, e
encontra um oposto no ódio ou no medo. Esse é o Amor definitivo, radical, infinito, o Amor
que move o sol e outras estrelas, o Grande Amor que é a Essência suprema de sua própria
Condição mais verdadeira. Por fim, essa Unicidade Amorosa é um estado sempre presente,
embora a maioria das pessoas intua apenas pedacinhos dele, geralmente quando a aplica
a alguém que ama individualmente – seu cônjuge ou seu filho, etc. Mas o Grande Amor ama
absolutamente todas as coisas e eventos existentes, e faz parte da Essência do seu próprio
ser. A natureza absolutamente inclusiva desse Grande Amor radical é tão completamente
abrangente, a ponto de muitas pessoas inicialmente a acharem chocante... como veremos.
Ora, muitas pessoas têm dificuldade em reconhecer esse Grande Amor realmente
infinito, e é aqui, novamente, onde entra o Tantra sexual. Porque um dos sentimentos mais
comuns associado ao sexo é um sentimento de unidade amorosa. Especialmente, se você
ama seu parceiro ou parceira, frequentemente sentirá durante o sexo que ambos se fundem
em uma unidade amorosa ímpar. De fato, a analogia mais comum que os místicos do mundo
inteiro usam para a sensação de Unidade Divina é a experiência da união sexual. E você
fará a mesma coisa com essa unidade amorosa como fez com a Bem-aventurança-e-a-
Testemunha – durante o sexo, sempre que qualquer um desses sentimentos de unidade
amorosa surgir, você o usará para lembrar-lhe, e pontuar diretamente, o Grande Amor
sempre presente do Sabor Único. A forma que a Plenitude radical do Sabor Único de fato
assume é um Amor absolutamente abrangente – e esse Amor envolve todo o universo –
cada simples coisa e evento do todo o mundo está embebido nesse Amor infinito. Você
consegue imaginar tanto Amor em sua vida? Bem, ele está ali, esperando por você.
Em suma, tudo o que você precisa saber sobre o quinto estado de consciência é: o
Grande Amor é o Sentimento de Plenitude radical do Sabor Único – Amor é o Sentimento
de Plenitude do Sabor Único. À medida que você se torna proficiente nisso, embora a
sensação sexual, temporal, finita de unidade amorosa afinal irá desaparecer, o Sentimento
sempre presente de um Sabor Único Amoroso não vai, e cada vez mais transformar-se-á
em uma sensação constante no âmago do seu Ser – não apenas uma experiência de pico,
mas uma experiência de platô.
Então, aqui estão todos os pontos importantes em duas frases: Bem-aventurança é o
Sentimento da Liberdade da Testemunha; e Amor é o Sentimento da Plenitude do Sabor
Único. E você pode gerar esses sentimentos infalíveis – Bem-aventurança e Amor –
enquanto a bússola aponta para a Iluminação toda vez que você faz amor.
Eis, assim, os Sentimentos da Iluminação. Vamos agora percorrer brevemente todos
esses pontos e dar instruções pontuais para cada um deles. Essas são práticas que você
pode usar todos os dias da sua vida, se quiser. E quanto mais você as usa, mais o sombrio
estado de espírito depressivo da pós-modernidade dará lugar a um platô de Beatífica
Harmonia Amorosa que permeará todo o seu Ser.
Comecemos pelo quarto estado de consciência, turiya ou Testemunha sempre
presente, o primeiro dos estados finais. Quanto a instruções pontuais, comece simplesmente
por estar consciente do que você chama de seu "eu" – esteja ciente de tudo o que você
considera como seu "eu" – e depois descreva em pensamento esse eu, como se estivesse
falando com alguém sobre ele. Talvez você diga: "Meu nome é fulano, minha altura é X,
peso Y quilos, tenho Z anos. Eu frequentei as escolas A, B e C, e atualmente trabalho em
tal empresa, meu salário é D, estou em um relacionamento há E anos, moro nesta cidade,
meu carro é da marca tal, gosto desse tipo de filmes e desses tipos de livros", e assim por
diante. E esse é você, o que você chama de eu.
Mas observe que existem dois eus aqui. Um é o eu que você acabou de descrever, o
eu que você pode ver como um objeto, do qual você consegue estar ciente e descrever. É o
seu eu visto como um objeto ou um conteúdo de Consciência. Mas além do eu que pode ser
visto, o eu que é um objeto, existe o Eu que está vendo, o Eu que é um Sujeito real, não um
objeto; o Eu que é o verdadeiro Observador, e não algo que é observado. O Eu Real não
pode ser visto, não mais do que um olho pode ver a si mesmo ou uma língua pode provar a
si mesma – é o Observador, o Eu verdadeiro, um genuíno Sujeito de Consciência, não um
objeto da Consciência. É a própria Consciência, não qualquer conteúdo da Consciência.
Assim, as Tradições afirmam que este Eu Real é "neti, neti", que significa "nem isto
nem aquilo". Não é esta coisa que pode ser vista, não é aquela coisa que pode ser vista, é
o Observador, o Eu verdadeiro, a Testemunha pura, e não qualquer coisa que possa ser
testemunhada. Portanto, aqui estão algumas instruções pontuais para essa Testemunha
pura, ou o Eu Real (e simplesmente deixe que estas afirmações se apliquem à sua própria
Consciência): "Eu vejo aquela montanha, mas não sou aquela montanha. Eu vejo esta
cadeira, mas não sou esta cadeira. Eu tenho sensações, mas não sou essas sensações. Eu
tenho sentimentos, mas não sou esses sentimentos. Eu tenho desejos, mas não sou esses
desejos. Eu tenho pensamentos, mas não sou esses pensamentos. Ao contrário, eu sou
uma vasta, aberta, vazia Clareira ou Abertura na qual todos esses objetos surgem, momento
a momento e, mesmo assim, não sou nenhum deles. Eu sou um amplo Vazio ou Espaço,
uma Testemunha pura – eu sou a Consciência genuína, não qualquer conteúdo ou objeto
da Consciência. O mundo inteiro de objetos – TUDO – surge na minha Consciência, e eu
sou neti, neti – não sou isto nem aquilo. Eu sou o que resta – um vasto Espaço ou Vazio ou
Clareira ou pura Abertura na qual tudo isso surge, uma imóvel Testemunha de tudo."
Portanto, quando você vai em busca do seu Eu Real, o puro Observador, a verdadeira
Testemunha, você não vê nada, nem fora nem dentro. Ou, mais precisamente, o que quer
que você veja está bem – é apenas outro objeto, não é o genuíno Sujeito, não é o Eu Real,
que está observando e é, em si mesmo, apenas uma vasta Abertura ou Clareira ou
Testemunha imóvel. Assim, a lista de coisas que você usou para descrever o seu eu não se
aplica ao seu Eu Real. Essa lista aplica-se apenas ao eu-objeto, o eu convencional e finito,
o ego, o eu que pode ser visto como um objeto – e, portanto, nenhum item dessa lista inteira
apresentada por você se aplica ao seu Eu Real. Essa lista é apenas um conjunto de coisas
que você NÃO é.
O ponto fundamental deste passo é entender verdadeiramente que qualquer coisa
que você consiga ver – qualquer coisa lá fora ou aqui – são todas apenas objetos, são todas
coisas que podem ser vistas; elas não são o Observador, elas não são o Eu Real, elas não
são a Testemunha. Eles são conteúdos da Consciência, não são a Consciência em si. O
mestre zen Shibayama chama o Eu Real de "Subjetividade Absoluta", porque é um Sujeito
puro, não um mero objeto; é um Eu Verdadeiro com Consciência Testemunhal, e não apenas
um objeto ou conteúdo dessa Consciência.
E é por isso que, quando você procurar pelo Eu Real, a verdadeira Testemunha, você
não verá nada em particular; tudo o que você começará a notar é uma vasta extensão de
Liberdade, pura Liberdade. Porque seu Eu Real é neti, neti – nem isto nem aquilo – e,
portanto, está Livre disto e Livre daquilo. Assim: "Eu tenho sensações, mas não sou essas
sensações; estou Livre delas. Eu tenho sentimentos, mas eu não sou esses sentimentos;
estou Livre deles. Eu tenho pensamentos, mas não sou esses pensamentos; estou Livre
deles." O seu Eu Real é apenas este sentimento de Liberdade infinita – de Libertação radical,
de completo Desapego. Portanto, se você está sentindo ansiedade, por exemplo, e isto
realmente o perturba, é porque você ainda está identificado com ela. Se você simplesmente
a Testemunhar – "eu sinto ansiedade, mas não sou ansiedade" – ela deixa de ser um
problema. Você tem ansiedade, ela não tem você. Você não é mais a vítima da Vida, você
é a Testemunha da Vida.
Ramana Maharshi chamou o Eu Real de "Eu-eu", Eu-hífen-eu, porque, quando você
está consciente de si mesmo, consciente do seu eu como um objeto, é seu Eu Real que está
consciente desse eu – é o Eu-eu, a Grande Mente ou a Testemunha que está consciente da
pequena mente ou do ego objetivo. Agora, vamos tentar o seguinte: de novo, simplesmente
esteja consciente de si mesmo – e o que está Consciente de si mesmo agora, isto que está
Testemunhando seu eu é o seu Eu Real, seu Eu-eu, turiya, a Testemunha. E quando você
busca essa Testemunha, você não vê nada em particular; tudo que você nota é uma vasto
Vazio, uma Liberdade radical, uma pura Abertura ou Clareira na qual surgem todos esses
objetos, momento a momento, mas você não é nenhum deles; está completamente Livre de
todos eles. Mais uma vez, é pura Consciência em si, não um mero objeto ou conteúdo da
Consciência.
E essa Consciência pura em si é Deus – a Identidade Suprema. Quando você está
consciente de si mesmo, é Deus diretamente consciente de você. E o Verdadeiro Você –
seu Eu Real – é Deus, a Testemunha Suprema. Como é dito nos Salmos: "Aquietai-vos, e
sabei que EU SOU Deus".
Aqui está exatamente o que isso significa. Continuamos com esse tipo de
"desidentificação radical" – "eu não sou isto, não sou aquilo". À medida que continuamos a
perceber que "eu não sou isto, não sou aquilo", logo não haverá identidade com isto ou com
aquilo, e tudo o que restará é uma pura qualidade de EU SOU, uma simples sensação de
EU SOU – não que EU SOU isto ou que EU SOU aquilo, não que EU SOU este corpo ou
que EU SOU este pensamento ou que EU SOU este desejo, mas apenas um genuíno
sentimento de EU SOU. O Eu Real é sua própria característica fundamental de EU SOU –
apenas a percepção simples, imediata e sempre presente de seu próprio Ser. Este senso de
EU SOU é a Testemunha, uma Realidade intemporal sempre presente – e as Tradições são
unânimes que este puro EU SOU, esta Consciência livre de conteúdo, é uma manifestação
direta do Espírito em si – e esse é o verdadeiro significado da Identidade Suprema. Lembrese
de que uma definição tradicional do Espírito absoluto é SatChitAnanda – Sat significa Ser
puro; Ananda, vimos, significa Bem-aventurança; e Chit significa Consciência pura antes de
estar Consciente de algo; somente Consciência pura, não o conteúdo da Consciência;
apenas a Testemunha pura, o próprio EU SOU, seu Eu Real, radicalmente uno com o
Espírito.
Quando Moisés perguntou a Deus quem ele, Moisés, deveria dizer às pessoas que o
havia enviado, a resposta foi: "EU SOU quem EU SOU" – pura Essência de EU SOU. Isto é
exatamente o que Cristo exprimiu quando disse: "antes que Abraão fosse, EU SOU" – essa
foi uma intuição exata dessa Testemunha fundamental e intemporal ou eterna. Seu próprio
EU SOU carrega a mesma intemporalidade e verdadeira eternidade. Pense no que você
estava fazendo há uma semana exatamente a esta mesma hora. Provavelmente, você não
conseguirá lembrar-se de detalhes precisos de seus pensamentos ou comportamento, mas
uma coisa é certa: a sensação de EU SOU estava presente. Pense no que você estava
fazendo há um mês e, novamente, mesmo que não seja possível lembrar-se de detalhes,
você sabe que EU SOU estava lá – e é a mesma sensação de EU SOU que você tem agora,
porque EU SOU, como o puro Observador, não tem qualidades ou características que
possam mudar ao longo do tempo (é neti, neti). Não há nada que se mova no tempo – é uma
radical Liberdade ou Clareira de tudo que é temporal; é Vazio puro e ilimitado, "neti, neti"
intemporal.
É por isso que a Testemunha é frequentemente chamada de "Consciência Imutável
Ilimitada". Então, há uma semana, há um mês, há um ano, há uma década, há um século,
há um milênio – ainda é o único e o mesmo EU SOU presente em cada período. Eis um
famoso koan do Zen: "Mostre-me sua Face Original, o rosto que você tinha antes de seus
pais nascerem." E eles dizem isto seriamente – isto não é simbólico ou metafórico; é literal!
Mas não significa que sua Face Original existiu em um tempo que foi cronologicamente
anterior ao tempo em que seus pais nasceram. Não, sua Face Original, seu Eu Verdadeiro,
é quem você realmente é antes que a ilusão do tempo seja criada. É quem você é no Agora
intemporal; é quem você é na eternidade, não na temporalidade. Então, um ano atrás, uma
década atrás, um século atrás, um milênio atrás – o mesmo intemporal e sempre presente
EU SOU que não entra no fluxo do tempo e, portanto, existe antes do nascimento de seus
pais, antes do nascimento deste sistema solar, antes do Big Bang e antes do fluxo do tempo.
Tudo bem até aqui? Começando a perceber? Erwin Schroedinger, o cofundador da
moderna mecânica quântica, conta uma bela história sobre uma pessoa que, diz ele, há
muitos séculos sentou-se no mesmo lugar em que você está agora; como você, essa pessoa
parecia sentir saudade em seu coração enquanto assistia ao pôr do sol; como você, ela
nasceu de uma mulher e sofreu; como você ela tinha aspirações, objetivos, desejos; como
você ela teve sonhos e visões e ansiou por poder. E então a conclusão impactante: "Seria
ela outra pessoa? Não seria você mesmo?"
Em outras palavras, o puro EU SOU daquela pessoa é o mesmo EU SOU que você
é agora. As Tradições são absolutamente unânimes aqui: o número total de EU SOU é
apenas um – um Eu, um Espírito, uma Realidade (ou como diz Schroedinger: "a consciência
é um singular cujo plural é desconhecido"). Um verdadeiro EU SOU não tem características
– mais uma vez, é neti, neti; não é isto, não é aquilo; ele apenas é sentido como uma
Liberdade infinita – e esse puro EU SOU está realmente olhando através dos olhos de todas
as pessoas. EU SOU é um singular cujo plural é desconhecido. E é por isso que cada um
de nós pode dizer com sinceridade: "antes que Abraão fosse, EU SOU".
Então, como essa Liberdade radical é realmente sentida? É aqui que os Sentimentos
de Iluminação entram em cena. Lembre-se de que vimos que o principal sentimento
associado a turiya (ou o quarto estado da Testemunha) é uma Alegria profunda, uma
Felicidade extática ou uma Bem-aventurança radiante. A Liberdade é geralmente uma
liberdade das restrições, uma liberdade do confinamento, uma liberdade de algo prendendo
você – e esse tipo de liberação é normalmente associado a uma profunda Felicidade ou a
uma verdadeira Alegria de estar livre. Como se você tivesse ficado preso injustamente por
anos e, então, fosse libertado; ao sair da prisão para o ar fresco, como você se sentiria? –
FELIZ!!! O mesmo acontece com o Eu Verdadeiro ou Testemunha – que é neti, neti, liberto
do mundo manifesto inteiro; essa imensa quantidade de Liberdade é recebida com uma
igualmente imensa quantidade de Felicidade extática ou Bem-aventurança verdadeira. Mas
não importa como expliquemos isto, o fato é que a maioria das Grandes Tradições Tântricas
associa a Grande Libertação a uma profunda Liberdade que gera uma grande Bemaventurança,
uma intensa e extática Felicidade Alegre. Portanto, o que nós queremos
perceber não é apenas a Liberdade da Testemunha, mas a profunda Bem-aventurança da
Liberdade da Testemunha. Em suma, queremos reconhecer a Testemunha Beatífica.
E é aí que entra em cena o sexo verdadeiro. Aqui estão algumas instruções
simplificadas. Ao iniciar a atividade sexual (e ela pode ser hétero, gay, lésbica, trans, bi, ou
qualquer outra das mais de cem diferentes orientações de gênero atualmente reconhecidas
pela Esquerda radical), comece mantendo-se na Testemunha (já que estamos focando a
Bem-aventurança).
Portanto, assuma a postura da Testemunha e inicie a prática sexual como preferir.
O único detalhe que você quer fazer diferente é: como a Testemunha, você não se
identifica com nenhum objeto, mas é meramente a pura Testemunha de qualquer um deles;
no entanto, nesta prática específica, comece a perceber qualquer sensação de prazer, não
importa de onde ela se origina, e identifique-a francamente com a Testemunha. À medida
que o orgasmo se aproxima, prepare-se para perceber os intensos sentimentos que surgem
com ele e direcione-os inteiramente à Testemunha. Ao sentir o começo do êxtase orgástico,
sinta diretamente que esse êxtase é o mesmo que o seu Eu da Testemunha, e olhe
realmente para o mundo através desta Testemunha abençoada. Sinta a felicidade de ser
absolutamente uno com a própria Testemunha; e sinta essa Bem-aventurança olhando para
o mundo inteiro em todas as direções.
Em outras palavras, use a pequena felicidade da liberação sexual para lembrar,
evocar e ressaltar imediatamente a verdadeira Grande Felicidade que já está presente na
própria natureza da Testemunha em si. Você está usando a intensidade de um pequeno
êxtase sexual temporal para lembrá-lo, imediatamente, de uma sempre presente Grande
Felicidade intemporal. Sinta de fato esse êxtase sexual e sinta profundamente também a
Testemunha, permitindo que essa intensa felicidade sexual o faça lembrar de, e direcione-o
diretamente para, uma Bem-aventurança imensamente maior, que se estende ao infinito. A
pequena felicidade é pequena porque localiza-se em um espaço relativamente pequeno –
parece preencher uma área dentro de seu corpo, ou se expande para uma área maior
imediatamente ao redor do seu corpo, ou talvez consiga preencher o ambiente em que você
se encontra; mas a Grande Felicidade expande-se preenchendo todo o universo –
simplesmente deixe a felicidade sexual se expandir e abraçar o Mundo inteiro, radiante,
extática, alegre. A Grande Felicidade é realmente Grande – engolfando o Kosmos inteiro. A
pequena felicidade afinal acaba; a Grande Felicidade não. Portanto use essa pequena
felicidade transitória para evocar, ressoar, relembrar, ajudar a gerar a Felicidade definitiva
que existe sempre já de qualquer maneira.
E assim: Bem-aventurança é o Sentimento da Liberdade da Testemunha. E essa é
uma prática que você pode facilmente fazer a cada dia da sua vida, se quiser. Portanto,
SatChitAnanda: você vivencia Sat ou Ser toda vez que você se coloca como EU SOU; você
percebe Chit ou Consciência toda vez que você se mantém como a Testemunha pura; e
você sente Ananda ou Bem-aventurança toda vez que você reconhece o Sentimento extático
da Liberdade infinita do seu Eu Real.
Muito bem, vamos em frente: observe que esse Eu Verdadeiro (ou Eu Real ou
Testemunha pura), como turiya ou o quarto estado, não é bem a suprema Realidade Não
Dual de Sabor Único (que é o quinto e derradeiro estado). Esse Eu da Testemunha é bem
real, é intemporal e eterno – mas ainda não é o último.
O passo final necessário é continuar Testemunhando, permanecendo como um
Observador imperturbável que Olha para cada coisa de maneira uniforme e sem julgamento,
e depois, gentil, mas completamente, relaxa esta Testemunha em tudo que está sendo
testemunhado. Desse modo, você deixa de Olhar a montanha para simplesmente ser a
montanha; você não vê mais as nuvens, você é as nuvens; você não sente mais a terra,
você é a terra. "Lá fora" e "aqui dentro" evaporam em "apenas isto" – esta presente
experiência única de Quididade ou Essencialidade – em outras palavras, Sabor Único.
Um modo de ajudar a reconhecer esse estado final de unidade é uma metáfora
simples que Douglas Harding apresentou, chamada de "não ter cabeça", que é um tipo de
instrução pontual para o Sabor Único. Pela minha experiência, cerca de metade das pessoas
que o tenta consegue imediatamente e cerca de metade não consegue. Se você não
conseguiu, não se preocupe; você vai conseguir em algum momento. Portanto, como
Harding explica, observe neste momento que você não pode realmente ver sua cabeça –
não efetiva e diretamente. Se você se concentrar na área onde sua cabeça está, tudo o que
verá são apenas duas manchas carnudas, que são o seu nariz. Mas, na verdade, não é bem
assim. Então, vamos verificar isso de perto. Eu vou apontar para algo que já está realmente
ocorrendo em sua consciência, mesmo que você possa não ter notado ainda; digamos que
você está olhando para a [mesa no palco]:
Ao olhar para esse objeto, se você se concentrar na área da sua cabeça, perceberá
que, em vez de ver uma cabeça entre seus ombros, o que você realmente verá é a mesa
entre em seus ombros, exatamente onde sua cabeça costumava estar. A mesa não está "lá
fora", do outro lado do seu rosto; na verdade, está aparecendo "aqui mesmo", desse lado do
seu rosto – o objeto, na verdade, está aparecendo dentro de você – está aparecendo
exatamente no espaço em que sua cabeça costumava estar. Está bem aqui entre seus
ombros, bem no espaço onde você achava que sua cabeça estava.
Se ocorre esse insight, você percebe que, não importa o que esteja vendo, não há
um dualismo "aqui dentro" separado de um "lá fora", como se você se afastasse e olhasse
– há uma experiência singular "apenas isto", que é o objeto que surge sobre seus ombros
exatamente onde sua cabeça costumava estar. "Lá fora" e "aqui dentro" começam a não
fazer sentido; não há separação entre sujeito e objeto, entre observador e observado; há
apenas uma experiência única do presente, e você é a singularidade dessa experiência
única – você não vivencia sua experiência presente, você é sua experiência presente, você
é uno com sua experiência presente. Em outras palavras, momento a momento, o universo
inteiro está surgindo dentro de você, é completamente um com você – e este é o Sabor
Único não dual.
Quando você percebe que tudo o que parecia estar "lá fora" é completamente um com
você, então a própria sensação do espaço "deste lado do seu rosto" – já que agora é
perfeitamente uno com tudo "lá fora" – o espaço da sua cabeça explode para incluir ou
abraçar a extensão total de tudo "lá fora" – expande-se para incluir a vasta extensão do
Espaço Total, e você agora é completamente um com cada pedacinho desse Espaço Total
(que está surgindo exatamente onde sua cabeça estava – sua cabeça, e seu próprio Ser,
agora é TUDO). Você não tem uma cabeça, você tem um universo. Então, permita de fato
que o eu se desenrole na vasta extensão do Espaço Total. Você é um com tudo o que está
olhando. Isto é a dualidade sujeito/objeto colapsando em uma experiência unitária ímpar de
Não Dualidade – ou Sabor Único. É a simples constatação de que você não é um eu isolado
que surge dentro da fronteira da pele, mas sim que você é um com TUDO da sua experiência
presente exatamente agora – você é verdadeiramente um com tudo, um com o Todo – uma
Identidade Suprema radical. Então, você está vendo tudo isso, tudo o que está surgindo
aqui? Bem-vindo ao seu Eu Real, perfeitamente como ele é, uma simples Quididade ou
Essencialidade ou Entidade.
Quando se trata de "não ter cabeça", eu sempre cito Trungpa Rinpoche. Perguntaramlhe
como é realmente a Iluminação, e ele respondeu: "O céu se transforma numa grande
panqueca azul e cai na sua cabeça." Isto é engraçado, mas é exatamente o que acontece.
O que você pensava ser um "céu" que estava "lá fora" ou "lá em cima" é, na verdade, uma
grande panqueca azul que está exatamente onde você achava que sua cabeça estava – e
não há distância entre você e o céu – você é esse céu, e ele está bem na sua cabeça, sem
separação alguma. Você pode até saborear o céu; ele está tão perto.
Tudo isso significa que essa simples metáfora – "não ter cabeça" – acaba sendo um
exemplo muito fácil e óbvio de uma Consciência sempre presente que é pura turiyatita, uma
genuína Consciência de Sabor Único. Com o truque de perceber que não temos cabeça – e
que o mundo inteiro de fato surge exatamente onde nossa cabeça costumava estar, e nós
somos radicalmente Um com esse Mundo completo – estamos realmente nos conectando a
uma realidade intensamente profunda onde não há sujeito versus objeto, nem o mundo está
dividido em uma classe que vê e uma classe que é vista; em vez disso, ele surge como uma
totalidade única que é inconsútil, mas não sem características; e se você sente seu "eu" (que
muitas pessoas acham estar "localizado" na cabeça) e depois essa "totalidade", verá que é
exatamente o mesmo sentimento (a grande panqueca azul caiu na sua cabeça) – e, portanto,
você não mais testemunha o mundo, você é o mundo. Desse modo, você não está tendo
uma experiência agora, você é sua experiência, toda ela, a sublime totalidade de tudo que
está surgindo; e você é isto. Como disse um mestre zen: "Quando ouvi o som do sino
tocando, não havia 'eu' nem sino, apenas o toque."
Então, quando se trata de Tantra sexual, comece por entrar em uma postura não dual
e sem cabeça de Sabor Único – por qualquer meio que funcione para você. Se você não
conseguir atingir o estado de Sabor Único, tudo bem, chegue o mais perto possível e
simplesmente prossiga. A questão é que os sentimentos sexuais evocados vão atuar como
ponteiros – como instruções pontuais concretas – ajudando você a identificar e reconhecer
a Unidade Amorosa mais profunda, sempre presente e radical que está, exatamente Agora,
refletindo a total Plenitude do seu próprio Sabor Único.
Portanto, quando você se envolver em sexo, preste especial atenção a qualquer
sensação de ardente conexão, de profundo cuidado, de carinhoso abraço – particularmente
aquele sentimento de unidade amorosa com seu parceiro ou parceira. Esteja especialmente
aberto aos sentimentos de união amorosa – na verdade, procure por esses sentimentos
durante o sexo. Lembre-se, o Grande Amor já está totalmente presente em cada momento
da sua existência. Da mesma forma que o Agora intemporal, o Grande Amor é uma realidade
sempre presente (independentemente de você se dar conta dele ou não); assim, use o sexo
para ajudar a encontrá-lo. O sentimento sexual de unidade ardente e harmonia amorosa lhe
proporcionará uma pista imediata da maravilhosa Plenitude Amorosa que você começa a
sentir, quase constantemente, à medida que desperta mais profunda e diretamente para o
Sabor Único e pura Quididade.
A questão é simplesmente começar a usar a pequena, relativa e finita união amorosa
do intercurso sexual para lembrá-lo diretamente de evocar e salientar a sempre presente
Unidade Amorosa de sua própria Consciência não-dual. Durante o sexo, sempre que você
sentir a intensidade de algum tipo de toque amoroso, ou cuidado, ou ternura, ou qualquer
tipo de abraço afetuoso ou unidade – foque nele, vivenciando-o e aplicando-o diretamente à
Plenitude do Sabor Único que você almeja conhecer. Mesmo que você ainda não tenha
acessado totalmente o estado de Sabor Único, essa prática é simples: chegue o mais perto
possível que conseguir do Sabor Único e comece a atividade sexual; e bem no momento em
que, por exemplo, você sentir um amor irresistível pelo seu parceiro ou parceira – "Eu te amo
tanto!" – aproprie-se desse sentimento de amor e permita que ele se expanda e se aplique
ao Mundo inteiro. Olhando para a vasta extensão "lá fora", expanda imediatamente esse
sentimento de "Eu te amo tanto!" e aplique-o à cena completa. Arroje-se em unidade
amorosa direta com tudo o que está surgindo agora – permita que o eu se desdobre na vasta
extensão do Espaço Total. Você tende a se sentir uno com qualquer coisa que você ame
profundamente – assim, não pare; ame absolutamente TODOS, ame TUDO sem exceção,
ame até doer (como Madre Teresa costumava dizer).
Sempre que você quiser saber como seria exatamente ser um com o mundo inteiro,
apenas pense em seus sentimentos de ser um com seu parceiro ou parceira e permita que
esses sentimentos se expandam e incluam o universo inteiro. Ou, mais precisamente, use
esses sentimentos de unidade amorosa com seu parceiro ou parceira para reconhecer e
sentir uma Unidade Amorosa similar que já está presente em seu Coração e já abraça o
Mundo inteiro – esta é a Plenitude do seu sempre presente Sabor Único. De qualquer
maneira, permita que seus sentimentos de amorosa unidade sexual se expandam e
envolvam todo o universo – é um Kosmos coberto de chocolate; engula-o inteiro.
E um pouco de atenção aqui. Este Grande Amor é de fato radical. "Absolutamente
inclusivo" significa completamente, totalmente, TUDO INCLUÍDO; nada é deixado de fora,
não importa quão trivial, desagradável ou profundamente negativo. É tão completamente
abrangente que, como mencionei anteriormente, muitas pessoas inicialmente se chocam.
Eu amo esse rio, amo as estrelas e amo aquela cordilheira. Eu amo meus amigos, amo
minha família e amo meus muitos colegas. Eu amo aquele ataque terrorista, amo desastres
ecológicos e amo o aquecimento global. Eu amo Black Lives Matter, amo supremacistas
brancos e amo o Talibã. Eu amo a úlcera hemorrágica do meu amigo, amo o câncer
metastático e amo aquele derrame cerebral recente. Eu amo o colapso econômico, amo
tumultos no centro da cidade e amo o vírus HIV. Você… começa… a … perceber… o…
quadro. Tudo incluído significa incluir realmente TUDO.
Portanto, esta é uma prática genuína: pense nas coisas mais horríveis que conseguir
e, em seguida, procure o Amor infinito em você que já ama completamente essas coisas,
não importa quão miseráveis. Esse Amor infinito já está lá (como uma parte intrínseca da
Essência do Ser Total); simplesmente procure por ele – faz parte da prática real. Ser uno
com a Essência do Ser Total é sentir-se unido a literalmente cada coisa e evento que existe
no Kosmos inteiro – você é Isto! Está tudo surgindo no seu interior, no âmago do seu Ser
mais profundo. E se você não sente esse infinito Amor universal, é porque existem algumas
coisas que, simplesmente, não consegue se ver amando e, assim, você não as Ama, não
percebendo a Essência dessa pura Unidade Amorosa. Você é a Luz do Mundo, e isso
significa TODA ela – não apenas uma luz aqui e nenhuma luz ali – não é assim que funciona.
"Eu, o Senhor, faço a luz cair sobre os bons e os maus; Eu, o Senhor, faço todas essas
coisas."
E então, tudo bem? Portanto, quando se trata de sexo, transfira seu sentimento de
amar seu parceiro ou parceira diretamente para Amar o mundo inteiro – TUDO, sem
exceções. Comece fazendo amor com seu parceiro ou parceira e continue fazendo amor
com o Universo, até tornar-se plenamente Um com ele – isto é o Sabor Único. Você vai do
ego para a Testemunha para o Sabor Único. O céu, o mundo inteiro, é uma grande panqueca
azul, e cai bem em cima da sua cabeça.
Assim, ao tentar realizar esse estado amoroso de Sabor Único durante a atividade
sexual, o objetivo é permitir que os sentimentos sexuais se expandam e se apliquem ao
Mundo inteiro, que é o que a Plenitude Amorosa do Sabor Único está sempre fazendo agora
mesmo. Busque ativamente em sua consciência por essa Unidade Amorosa que já está
transbordando e abraçando todo o Mundo em uma singularidade de Amor radical – seu
próprio Sabor Único sempre presente. Sempre que você sentir uma direta unidade ou união
com seu parceiro ou parceira, permita que o sentimento de unidade amorosa extravase
desse local e se expanda para uma unidade com o universo inteiro – essa é a real Plenitude
de um genuíno Sabor Único, e é sua Identidade Suprema, eterna e intemporal – você, que
é a Verdade última, a Luz do Mundo inteiro.
Enfim, esse foi um breve passeio pelos Sentimentos da Iluminação. Nós vimos que
esse Estado supremo tem duas grandes dimensões – turiya e turiyatita, ou a Testemunha
transcendental e o Sabor Único não dual. A Testemunha, uma vez que transcende o mundo
inteiro (é neti, neti), traz uma sensação de Liberdade radical (é daí que vem a noção de
nirvana. E o nirvana é muito, muito real – não é conversa fiada teórica. Quando a fonte da
consciência é rastreada até seus fundamentos em turiya ou genuíno EU SOU, o mundo
inteiro propriamente dito para de surgir na Consciência, e essa pura cessação – essa
Consciência livre de conteúdo – é o nirvana, onde o indivíduo está radicalmente Livre de
tudo, inclusive até mesmo de sofrimento intenso. Vimos exemplos chocantes e clamorosos
da realidade do nirvana durante a guerra do Vietnã. Em algumas ocasiões, monges
protestando contra a guerra, assumiram a posição de meditação, entraram em profundo
nirvana de "não isto, não aquilo", encharcaram o corpo com gasolina e atearam fogo às
vestes. E ali mesmo, com TV ao vivo, queimaram até virar cinzas; e nenhum deles titubeou.
Essa Liberdade é extremamente real, não é algo que estamos inventando.)
E, como temos dito, essa Liberdade não é apenas uma cognição, é um sentimento:
Bem-aventurança (ou Alegria profunda ou Felicidade extática), e essa Bem-aventurança é o
Sentimento da Liberdade da Testemunha. O mestre espiritual norte-americano Adi Da tinha
uma prática de investigação: qualquer experiência que você tenha, simplesmente pergunte:
isto é Felicidade? Se não se sentir profundamente Feliz, exatamente agora, você não está
em contato com seu Eu Verdadeiro. (A propósito, independentemente do que você pense
sobre Adi Da, ele foi um sujeito brilhante; note que no último nome que escolheu para si [Adi
Da Love-Ananda Samraj] constam as palavras com as quais ele mais desejava se identificar:
Love – Amor e Ananda – Bem-aventurança, exatamente os Sentimentos da Iluminação.)
E enquanto a Bem-aventurança ou Felicidade extática é o sentimento da Liberdade
da Testemunha, o Amor é o Sentimento da Plenitude do Sabor Único. Após dar um passo
atrás e desindentificar-se completamente do Mundo inteiro, de modo que você não seja nada
mais que a Testemunha Bem-aventurada, você dá um passo à frente e abraça o Mundo
inteiro – e esta é a Plenitude do Sabor Único supremo. O Sentimento dessa Plenitude é um
Amor radical, o Amor que de fato move o sol e outras estrelas.
Shankara costumava resumir todo o Vedanta em apenas três frases:
O mundo é ilusório.
Somente Brahman é real.
Brahman é o mundo.
Compreendeu? Todas essas três dessas realizações são necessárias. O mundo é
ilusório, somente Brahman é real – isso significa a Testemunha. Como Testemunha, você
se desidentifica completamente e se desapega totalmente de todos os objetos, todas as
coisas, todas as entidades finitas – você se libera de todas as sombras na Caverna: eu sou
neti, neti, eu não sou isto nem aquilo. Depois de ter percebido verdadeiramente o Vazio
absoluto do Mundo inteiro – uma vez que percebeu que o mundo é ilusório e somente a
Testemunha é real – então você está em condições de dar um passo adiante e abraçar
completamente o mundo, todo ele, à medida que a Testemunha entra em colapso com tudo
testemunhado – e, portanto, nesse ponto, Brahman é o mundo (Sabor Único não dual). E
Sentimentos profundos acompanham cada um desses passos – uma Testemunha Bemaventurada
e um Sabor Único totalmente Amoroso.
Você almeja alcançar esses sentimentos direta e completamente. E você pode usar
suas versões manifestas e finitas de unidade amorosa e liberação extática encontradas na
sexualidade como instruções pontuais para os Sentimentos infinitos em questão. Você
simples, mas diretamente, assume os sentimentos de êxtase amoroso que surgem durante
a prática sexual e expande os sentimentos provenientes de seu parceiro ou parceira para o
Mundo inteiro – você literalmente faz amor com o Mundo, momento a momento a momento.
Você absorve os sentimentos extremamente intensos de bem-aventurança extática e
unidade amorosa que surgem durante o ato sexual e usa-os como indicadores para a
Grande Bem-aventurança e Grande Amor que são sua Condição eterna e intemporal – os
Sentimentos de Iluminação.
Vimos que para experienciar verdades eternas, não precisamos viver em algum tipo
de duração temporal permanente ou, após a morte, em alguma morada celestial que se
estende para sempre no tempo. Conhecemos a eternidade não vivendo para sempre, mas
vivendo plenamente neste Agora. Portanto, eu repetirei uma última vez: não é difícil
encontrar a eternidade; é impossível evitá-la. E se está tendo dificuldade para encontrá-la,
você pode observar diretamente os sentimentos que surgem a cada vez que você faz sexo.
O êxtase orgástico e a unidade terna e amorosa da sexualidade podem ser usados como
indicadores diretos da Grande Bem-aventurança e do Grande Amor que são sua eterna
Condição sempre presente.
Você pode encontrar Deus e seu Eu Real toda vez que faz amor. Os sentimentos
diretos do sexo são um caminho infalível para a Realização Espiritual; desse modo, o sexo
torna-se uma verdadeira forma de oração. E com o Tantra Integral, recomendamos que você
ore com frequência. Na verdade, orar nunca é demais. E quanto mais você orar, maior a
probabilidade de você Despertar [Wake Up]. E esse Amor Bem-aventurado é o único,
verdadeiro e importante antídoto para a cegueira suicida de nosso mundo pós-moderno.
Assim, pense um pouco sobre essas ideias, experimente essas práticas, incorporeas
a sua Prática Integral de Vida e veja o que acontece. Desejo-lhes tudo de bom neste
empreendimento notável, e muito obrigado a todos por estarem aqui..."